Reprodução/CPG
12/12/2025 | 12 min para saber
A partir de 1º de março de 2026, supermercados, mercados,
atacarejos e outros estabelecimentos de gêneros alimentícios do Espírito Santo
ficarão proibidos de abrir aos domingos, em um acordo coletivo considerado
histórico entre representantes de trabalhadores e do comércio.
A medida, válida até 31 de outubro de 2026, funciona como
um projeto-piloto para testar os efeitos do fechamento de supermercados
aos domingos sobre faturamento, organização do varejo e qualidade de vida
de quem atua no setor.
Acordo coletivo no Espírito Santo define novas regras
para o varejo alimentar
O fechamento dominical foi incluído na Convenção Coletiva
de Trabalho 2025–2027, firmada entre a Federação do Comércio de Bens, Serviços
e Turismo do Espírito Santo (Fecomércio-ES) e o Sindicato dos Comerciários do
Espírito Santo (Sindicomerciários-ES).
A cláusula específica, voltada ao descanso aos domingos,
determina que, entre março e outubro de 2026, os empregados do setor
supermercadista não poderão ser escalados para o trabalho no último dia da
semana.
A regra alcança redes de supermercados, hipermercados,
autosserviços, atacadistas, atacarejos, mercearias, hortifrutigranjeiros,
minimercados e estabelecimentos de gêneros alimentícios instalados em shopping
centers.
Lojas de material de construção também entram no acordo e
devem permanecer fechadas aos domingos durante o período.
Demais segmentos de shoppings e do varejo em geral
continuam autorizados a funcionar, o que mantém parte da movimentação
tradicional de lazer e serviços aos fins de semana.
Embora alguns canais de comunicação tratem a mudança como
“nova lei”, o instrumento jurídico é um acordo coletivo de trabalho,
resultado de negociação entre sindicatos patronais e de trabalhadores.
A convenção estabelece que a cláusula sobre o domingo
será reavaliada nas negociações econômicas previstas para novembro de 2026,
após a análise dos sete meses de experiência.
Motivações para o fechamento dos supermercados aos
domingos
O debate sobre o fechamento dominical ganhou força no
Espírito Santo após reclamações de trabalhadores sobre jornadas prolongadas,
escalas imprevisíveis e dificuldade de conciliar folga com a rotina familiar.
A Reforma Trabalhista de 2017 ampliou o espaço para
negociações coletivas por categoria, e o tema do descanso aos domingos voltou à
mesa de negociações entre o sindicato dos comerciários e o setor
supermercadista.
Do lado empresarial, pesou a avaliação de que operar aos
domingos com equipes incompletas se tornou um desafio constante.
Representantes do setor citaram escassez de mão de obra,
aumento de faltas, uso recorrente de atestados médicos e dificuldade para
fechar escalas completas, o que impacta o atendimento ao público e eleva o
estresse no dia a dia das lojas.
A solução encontrada foi transformar o domingo em dia de
descanso garantido para a maior parte dos trabalhadores do varejo alimentar,
concentrando o funcionamento das lojas de segunda a sábado.
A intenção das entidades é testar se esse redesenho da
jornada reduz o desgaste físico e emocional, diminui afastamentos por saúde e
contribui para a retenção de funcionários, sem comprometer de forma
irreversível o faturamento do setor.
Mudanças no comportamento do consumidor com o fechamento
dominical
Para os consumidores, a principal consequência prática é
a necessidade de reorganizar as compras.
Quem costuma deixar a reposição da despensa para o
domingo terá de antecipar a ida ao supermercado para sexta-feira ou sábado, ou
adaptar a rotina para os demais dias da semana.
Em muitas famílias, o passeio dominical ao supermercado
faz parte do hábito de lazer, o que tende a ser substituído por outras
atividades.
Esse redesenho do calendário de compras pode fortalecer
canais complementares.
Pequenos mercados de bairro, mercearias familiares,
padarias e açougues ganham espaço como alternativas de proximidade para compras
rápidas ao longo da semana, especialmente de itens frescos e de consumo
imediato.
Em regiões onde esses estabelecimentos já tinham forte
presença, a tendência é que absorvam parte da demanda deslocada dos grandes
supermercados.
Ao mesmo tempo, o comércio eletrônico deve se tornar
ainda mais relevante.
Plataformas de compras online, aplicativos de entrega e
clubes de assinatura de hortifrúti e cestas básicas podem se consolidar como
solução para consumidores que preferem planejar a reposição com antecedência e
receber os produtos em casa, em horários mais flexíveis.
Grandes redes de varejo alimentar já vinham investindo em
canais digitais, e o fechamento dominical tende a acelerar esse movimento.
Impactos para os trabalhadores do setor supermercadista
Para quem atua em supermercados, a mudança representa um
ganho de previsibilidade.
Em vez de escalas alternadas, em que o descanso dominical
muitas vezes ocorria de forma irregular, o acordo garante que o domingo deixe
de ser dia útil para a maioria dos empregados do setor de gêneros alimentícios
no Espírito Santo.
Essa previsibilidade é vista por sindicatos como um
avanço em termos de convivência familiar, lazer e recuperação física.
Isso ocorre especialmente em atividades marcadas por
longos períodos em pé, carregamento de peso e atendimento direto ao público.
Experiências internacionais apontam que escalas de
descanso mais estáveis podem contribuir para reduzir estresse, afastamentos
médicos e rotatividade em atividades de varejo.
Os efeitos, porém, dependem do contexto local e da forma
como as empresas organizam suas equipes.
Outra conquista destacada nas negociações foi a inclusão
de um benefício de auxílio-alimentação mensal e o reajuste do piso salarial da
categoria.
Sindicatos afirmam que a combinação de remuneração e
descanso estruturado ajuda a tornar o emprego no comércio mais atrativo em um
cenário de disputa por mão de obra.
Reação econômica e ajustes esperados no varejo capixaba
Mesmo com o foco no descanso, a mudança preocupa
empresários.
Em muitas cidades brasileiras, o domingo responde por uma
fatia importante das vendas, impulsionada pela maior disponibilidade de tempo
dos consumidores e por campanhas promocionais específicas.
No Espírito Santo, redes e atacarejos avaliam que o
fechamento dominical pode provocar, ao menos no curto prazo, uma queda de
faturamento e a necessidade de readequar operações internas.
A expectativa do setor é de que parte das compras se
concentre ainda mais entre sexta e sábado, ampliando o fluxo de clientes e a
pressão sobre estoques e equipes nesses dias.
Ao mesmo tempo, executivos acompanham com atenção a
possibilidade de migração de consumo para formatos não afetados pelas regras,
como lojas de conveniência e farmácias.
Empresários também sinalizam que o resultado do período
de teste será determinante para a postura nas negociações de novembro de 2026.
Caso os indicadores de receita mostrem impacto intenso e
persistente, a pressão por flexibilizações tende a aumentar.
Se houver redistribuição de vendas sem grandes perdas, o
fechamento dominical pode se consolidar como novo padrão no estado.
Espírito Santo como referência nacional para
funcionamento do comércio
O arranjo adotado transforma o Espírito Santo em espécie
de laboratório para o país.
Como a medida decorre de um acordo coletivo e não de lei,
outros estados podem acompanhar os resultados e, se considerarem positivos,
reproduzir cláusulas semelhantes em suas convenções coletivas.
Entidades sindicais e federações do comércio monitoram o
caso, observando indicadores de emprego, satisfação dos trabalhadores,
desempenho das empresas e efeitos sobre o comércio de bairro.
Os resultados entre março e outubro de 2026 serão
avaliados em novembro, quando as partes decidirão se mantêm, ajustam ou
encerram a regra.
Serão considerados não apenas o comportamento do
faturamento, mas também dados sobre afastamentos por saúde, rotatividade e
percepção dos consumidores.
Se a experiência indicar que é possível assegurar
um descanso semanal mais estruturado sem desequilíbrio grave nas
finanças, o estado pode reforçar o debate nacional sobre jornadas e
funcionamento do comércio.
Em sentido oposto, resultados negativos podem fortalecer
o argumento de que a abertura dominical segue essencial para a competitividade
do varejo.
Nesse cenário de mudanças graduais, como você acredita
que a rotina de compras e de trabalho deve evoluir caso esse modelo se espalhe
para outras regiões do país?
Fonte: CPG