A cobrança de tributo sobre dividendos e de IPVA sobre barcos e aeronaves está conquistando mais defensores e pode aparecer no relatório.
Em ano de pandemia
e de eleições, a tramitação de alguns projetos se arrastou no Congresso. É o
caso da reforma tributária, que tem uma comissão mista para avaliar tanta
proposta diferente. Apesar da falta de consenso entre os parlamentares e de
clareza das propostas do Executivo, duas propostas de tributação vêm angariando
simpatia, principalmente entre a oposição. A cobrança de tributo sobre
dividendos e de IPVA sobre barcos e aeronaves está conquistando mais defensores
e pode aparecer no relatório do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).
A Comissão Mista da
Reforma Tributária, composta por 25 senadores e 25 deputados, prorrogou os trabalhos
até dezembro. A expectativa é de que Ribeiro apresente seu relatório até dia
10. De acordo com a CNN, o deputado estaria disposto a fazer esse aceno à
esquerda e incluir os dois temas em seu relatório.
Segundo o
"Valor", o relator também estaria propenso a propor a inclusão, na
Constituição, de determinação de que a tributação sobre o patrimônio e as
heranças seja progressiva, de forma que os mais ricos paguem mais. No caso
específico das heranças, há quem veja espaço para aumento no Imposto sobre Transmissão
Causa Mortis e Doação (ITCMD), tributo estadual que hoje tem alíquota máxima de
8%.
No caso do
patrimônio, uma das sugestões que podem ser acatadas pelo relator diz respeito
justamente à tributação de barcos e aeronaves. Hoje só veículos terrestres
pagam IPVA.
A sugestão de
incluir a cobrança para veículos aquáticos e aeronaves – como lanchas, iates,
helicópteros e jatinhos – já aparece em ao menos cinco propostas de emendas à
PEC 45, que tramita na Câmara. Esse tema também já havia sido alvo de emendas
na PEC 110, que foi aprovada na Câmara e agora tramita no Senado. Sobre os
dividendos, o mote é acabar com a isenção ou incentivo em relação ao Imposto de
Renda que incide sobre lucros e dividendos e juros de capital próprio. Também
há seis propostas de emenda sobre esse tema na PEC 45.
O presidente do
colegiado, o senador Roberto Rocha (PSDB-MA), diz que “com o engajamento
necessário, creio ser possível obter a aprovação da reforma tributária na
Câmara e no Senado e sua promulgação ainda este ano”, conforme registro da
Agência Câmara.
O presidente da
Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), também admite que há possibilidade
de votar a reforma em dezembro caso haja um acordo entre parlamentares e
governo. “A reforma tributária está pronta. Pena que o governo ainda não se deu
conta, porque seria o grande beneficiado. (…) Também estamos conversando com a
esquerda, que tem condição de ajudar com temas que não vão gerar nenhuma
polêmica”, declarou, segundo a Agência Câmara.
Vale destacar que o
recesso legislativo começa oficialmente em 23 de dezembro – isto é, daqui a
menos de um mês – e que as votações na Câmara têm sido obstruídas pelo Centrão
e pela oposição, cada um com seus motivos. Nem a Lei de Diretrizes
Orçamentárias (LDO), fundamental para que o governo possa manter a máquina
pública funcionando, foi apreciada até agora.
O impasse do IPVA
para barcos e aeronaves na reforma tributária
A discussão sobre a
cobrança de algum tipo de imposto que incida sobre a propriedade de veículos
aquáticos e aeronaves não é nova. O Imposto sobre Propriedade de Veículos
Automotores (IPVA) sucedeu a Taxa Rodoviária Única (TRU), que historicamente
não incluía veículos que não sejam de transporte terrestre, já que parte dos
recursos arrecadados era destinada à manutenção de estradas. Em 2007, o Supremo
Tribunal Federal (STF) analisou um recurso extraordinário e entendeu que
embarcações e aeronaves não devem pagar o IPVA.
A decisão, no
entanto, não tem poder vinculante, o que abre espaço para que o tema volte a
ser debatido, como ocorre agora. O discurso é que a tributação desses bens de
luxo ajudaria a corrigir as distorções históricas do sistema tributário
brasileiro. “Os que possuem bens desse jaez apresentam grande capacidade
contributiva e devem recolher ao Estado um tributo em razão do patrimônio em
questão. Não há, nesse sentido, justificativa razoável para permitir a cobrança
com relação aos veículos terrestres e excluir as embarcações e as aeronaves”,
escreveram os deputados Tabata Amaral (PDT-SP) e Felipe Rigoni (PSB-ES), em
emenda.
Outro fator que
pesa para a aceitação do novo imposto é o potencial de arrecadação. “O
potencial de ganho aos cofres públicos é estimado em R$ 4,6 bilhões. Desse
valor, 50% será destinado aos municípios conforme regras a serem estabelecidas
em Lei Complementar”, justifica o deputado André Figueiredo (PDT-CE), em sua proposta
de emenda, com base em dados do Sindicato Nacional dos Auditores-Fiscais da
Receita Federal do Brasil (Sindifisco).
O IPVA para barcos
e aviões foi alvo de inúmeras menções nas audiências públicas realizadas pela
Comissão Mista. Em um desses encontros, no dia 5 de agosto, o deputado Mauro
Benevides Filho (PDT-CE) comentou que “quando uma pessoa de classe média ou
menos favorecida compra um carro, ela é obrigada a pagar IPVA, mas, quando um
rico compra um barco ou um avião, ele paga zero de IPVA". "Nós temos
que fazer essa correção urgentemente”, disse.
O ministro da
Economia, Paulo Guedes, que participou do encontro, concordou com a observação.
“Esse imposto sobre propriedade, essa base sobre propriedade é um objeto
legítimo também e é um capítulo do livro. Há que se falar sobre isso também”,
disse.
Imposto sobre
dividendos tem discussão mais calorosa
Atualmente, os
dividendos de ações, que são a distribuição de parte do lucro da empresa para
seus acionistas, não pagam Imposto de Renda, independentemente do valor. A
retomada dessa tributação, que foi suspensa em 1995, é cogitada há tempos pela
equipe econômica do governo Bolsonaro, e também vem sendo discutida no âmbito
da reforma tributária.
Os argumentos
favoráveis a essa medida costumam estar ligados à defesa de maior
progressividade do sistema tributário. A ideia é tirar peso de impostos que
incidem sobre o consumo e aumentar a participação dos impostos sobre a renda.
Esse foi um dos
pontos destacados pelo deputado Mauro Nazif (PSB-RO) em sua proposta de emenda.
O parlamentar cita que o Brasil tem quase 50% da arrecadação tributária
proveniente do consumo, enquanto a média dos países da OCDE é de 32%. Para ele,
ao acatar uma tributação de dividendos, “a classe política brasileira dará um
sinal claro e firme na direção para que haja a redução das desigualdades
sociais, fazendo que a reforma tributária a ser aprovada resgate os princípios
basilares da justiça fiscal: equidade, capacidade contributiva e
progressividade”.
O deputado
Frederico (Patriota-MG), autor de outra emenda para a tributação dos
dividendos, destaca a arrecadação. “Estudo do Instituto de Pesquisa Econômica
Aplicada (Ipea) estima que a tributação sobre lucros e dividendos no Brasil
teria um potencial de arrecadação entre R$ 22 bilhões e R$ 39 bilhões. De
acordo com o instituto, a criação do tributo ajudaria na redução da
desigualdade social do Brasil, em especial caso a arrecadação fosse compensada
por uma redução de outro tributo, no caso o PIS/Cofins”, escreve em sua
justificativa.
A discussão da
tributação dos dividendos, no entanto, ainda carece de aprofundamento para
determinar como seria feita a cobrança. O economista Marcos Lisboa, presidente
do Insper, fez um alerta em audiência pública da Comissão Mista no dia 17 de
setembro.
“O dividendo é o
lucro do acionista que já pagou o imposto. Então, é preciso separar. Agora, no
Brasil, a gente confunde o tamanho da empresa com o tamanho do acionista. Se a
empresa é grande, assume-se que o acionista é grande. Isso vai ser verdade para
alguns acionistas, e não para outros”, disse. Para ele, a solução ideal
passaria por uma redução do imposto para pessoa jurídica associado à tributação
de famílias na proporção de sua renda. Uma redução do IRPJ, simultânea à maior
tributação da pessoa física, está no discurso da equipe econômica desde a época
da eleição presidencial.
A senadora Zenaide
Maia (PROS-RN) questionou, no encontro do dia 5 de outubro, a questão da regressividade
dos tributos brasileiros. “O que é consenso aqui? Simplificar impostos,
modernizar essa máquina de cobrança de impostos, taxar lucros e dividendos, e
uma tabela progressiva, gente. Não é possível que alguém que ganhe R$ 5 mil
pague 27,5% de Imposto de Renda e quem ganhe mais de R$ 100 mil pague os mesmos
27,5%”, ponderou.
Nessa mesma
ocasião, o secretário da Receita Federal, José Tostes Neto, apenas respondeu
que questões relacionadas ao Imposto de Renda da Pessoa Física, deduções,
tributação de pessoas jurídicas e distribuição de lucros e dividendos seriam
discutidas “quando do encaminhamento das propostas e após as decisões que vão
ser tomadas em relação ao conjunto dessas outras propostas de reforma
tributária”.
O ministro Paulo
Guedes, quando participou de um encontro da comissão ainda em agosto, ressaltou
que pretende implementar a tributação de lucros e dividendos, mas deu uma
alfinetada nos parlamentares. “Eu diria que vários Governos passaram por aí em
10, 15, 20, 30 anos e não tributaram lucros e dividendos. Não estavam
preocupados com essa progressividade do Imposto de Renda. Aparentemente,
fizeram algum pacto de coexistência e coabitação aqui em Brasília que impedia
tributar os lucros e dividendos. Nós vamos enfrentar isso”, afirmou.
FONTE: ASCOM/GOV.BR