Enquanto um grupo de neurocientistas avaliava um paciente de 87 anos com epilepsia, o idoso acabou sofrendo um ataque cardíaco e morreu.
Diante do resultado inesperado, foram obtidos dados inéditos de como o cérebro se comporta na hora da morte, e o que impressionou os pesquisadores foi a indicação de que lembranças da vida são resgatadas nos últimos momentos de vida. Tal percepção foi revelada por padrões de ondas rítmicas semelhantes às que são registradas durante o sono ou a meditação.
O estudo desse caso, revisado por pares, foi publicado no periódico “Frontiers in Aging Neuroscience” nesta terça-feira, dia 22.
O objetivo inicial do cientista Raul Vicente, da Universidade de Tartu, na Estônia, e seus colegas, de várias instituições pelo mundo, era detectar as convulções do paciente por meio de eletroencefalografia contínua (EEG). A equipe, porém, foi surpreendida pela morte do paciente.
Segundo o neurocirurgião Ajmal Zemmar, da Universidade de Louisville, EUA, foram medidos 900 segundos de atividade cerebral perto do instante da morte do paciente.
“E estabelecemos um foco específico para investigar o que aconteceu nos 30 segundos antes e depois que o coração parou de bater”, acrescentou Zemmar, quem organizou o estudo, conforme o portal “Eurekalert”. “Pouco antes e depois que o coração parou de funcionar, vimos mudanças em uma faixa específica de oscilações neurais, as chamadas oscilações gama, mas também em outras como oscilações delta, teta, alfa e beta”.
A ondas cerebrais do tipo gama mencionadas por Zemmar são referentes a funções altamente cognitivas, relacionadas à concentração, sonhos, meditação, recuperação de memória e processamento de informações. Por isso, o cientista avalia que o cérebro pode reproduzir uma última lembrança de eventos importantes da vida pouco antes da morte através da geração de tais oscilações.
“Semelhantes aos relatados em experiências de quase morte”, descreveu. “Essas descobertas desafiam nossa compreensão de quando exatamente a vida termina e geram importantes questões subsequentes, como aquelas relacionadas ao momento da doação de órgãos”.
No entanto, a interpretação dos dados acaba sendo dificultada nesse caso, que marcou a primeira vez que o cérebro humano foi analisado de tal forma, considerando que o paciente havia sofrido lesão, convulsões e inchaço. Apesar disso, Zemmar enxerga esperança para realização de outros estudos.
“Algo que podemos aprender com esta pesquisa é: embora nossos entes queridos tenham os olhos fechados e estejam prontos para nos deixar descansar, seus cérebros podem estar revivendo alguns dos melhores momentos que vivenciaram em suas vidas”, afirmou.
O Globo