Foto: Valneva
22/05/2025 | 10 min
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Os Estados Unidos e a Europa deram início a uma investigação sobre a vacina contra a chikungunya Ixchiq, da farmacêutica franco-austríaca Valneva, que recebeu recentemente aval para uso no Brasil. Segundo as autoridades sanitárias americanas e europeias, são monitorados relatos de efeitos adversos graves em idosos. Ambas interromperam a indicação para maiores de 60 anos, nos EUA, e de 65, na Europa.
A Food and Drug Administration (FDA), órgão regulador dos
EUA, foi o primeiro a autorizar o imunizante no mundo, ainda em 2023, para a
população adulta. A Agência Europeia de Medicamentos (EMA, da sigla em inglês)
aprovou a dose em maio do ano passado para maiores de 18 anos, depois
estendendo o público elegível para todos acima de 12.
No Brasil, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa) deu o sinal verde à vacina para pessoas de 18 a 65 anos em abril deste
ano, embora a dose ainda não tenha sido comercializada no país. O pedido foi
realizado em parceria com o Instituto Butantan, em São Paulo, que tem um acordo
com a farmacêutica para produzir uma versão própria do imunizante, já em
análise na agência. Como uma das contrapartidas, o instituto brasileiro foi
responsável por conduzir estudos clínicos da Ixchiq com adolescentes.
As duas vacinas têm praticamente a mesma composição, mas a
versão produzida com componentes nacionais no Butantan será melhor adequada à
incorporação pelo SUS (Sistema Único de Saúde (SUS). Após o aval da Ixchiq no
Brasil, o Ministério da Saúde afirmou que pretende solicitar a inclusão da dose
na rede pública. Em nota, o Butantan diz que "está acompanhando as
investigações" sobre o imunizante.
Reações graves
No último dia 7, a EMA anunciou a revisão da vacina e a interrupção na
indicação acima dos 65 anos “após relatos de eventos adversos graves em
idosos”. Até a data, entre mais de 43,4 mil doses aplicadas no mundo, foram
relatadas 17 reações graves, incluindo duas mortes entre pessoas de 62 a 89
anos, segundo a agência.
Um dos casos fatais foi de um homem de 84 anos que
desenvolveu encefalite, uma inflamação do cérebro. O segundo foi também de um
homem, de 77 anos, com doença de Parkinson, cuja dificuldade de engolir piorou
e pode ter causado pneumonia por aspiração, afirmou a EMA. Ambos os casos foram
registrados no território ultramarino francês de La Réunion, onde uma campanha
de vacinação está em andamento após um surto da doença.
A EMA reforçou que muitas pessoas que tiveram reação grave
“tinham outras doenças, e a causa exata desses eventos adversos e sua relação
com a vacina ainda não foram determinadas”. Mas, como os estudos clínicos que
demonstraram a segurança do imunizante envolveram principalmente participantes
abaixo dos 65 anos, a agência decidiu interromper, enquanto durar a
investigação, a indicação para os mais velhos.
O comitê de segurança do órgão analisará os dados
disponíveis e fará uma recomendação sobre os termos de autorização da vacina.
Na União Europeia, a dose está disponível na Áustria, Bélgica, Dinamarca,
Finlândia, França, Alemanha, Luxemburgo, Holanda, Noruega e Suécia.
Nos Estados Unidos, dois dias depois do anúncio da EMA, a
FDA e os Centros de Controle e Prevenção de Doenças do país (CDC) afirmaram que
também estavam deixando de recomendar a vacina para indivíduos com 60 anos ou
mais enquanto “investigam relatos pós-comercialização de eventos adversos
graves”.
As autoridades citaram os mesmos 17 eventos adversos graves
e acrescentaram que 6 deles foram registrados nos EUA. Mas reforçaram que a
maioria “ocorreu em indivíduos com condições médicas crônicas subjacentes” e
que esses casos são suspeitas que precisam ser investigadas, ou seja, “podem
não ter relação causal com a vacinação”.
A Ixchiq contém uma versão viva e enfraquecida do vírus
chikungunya e, segundo a FDA, pode causar sintomas semelhantes aos da doença.
Nos estudos clínicos avaliados pela agência, no entanto, que vacinaram 3,5 mil
pessoas com 18 anos ou mais na América do Norte, as reações mais comuns foram
dor de cabeça, fadiga, dor muscular, dor nas articulações, febre, náusea e
sensibilidade no local da injeção.
“A FDA realizará uma avaliação de risco-benefício atualizada
para o uso do Ixchiq em indivíduos com 60 anos de idade ou mais. (...) A FDA e
o CDC informarão o público quando as agências concluírem a avaliação desse
problema de segurança”, afirmaram as autoridades americanas.
No Brasil, não houve alteração por parte da Anvisa em
relação à indicação da vacina, que já é restrita ao público de até 65 anos. Em
nota, a agência afirma que "acompanha as ações" das autoridades
estrangeiras e que, como parte das atividades de farmacovigilância, está
"avaliando o benefício-risco do uso da Ixchiq em indivíduos nesta faixa
etária (60 anos ou mais)". Mas reforça que o imunizante ainda não foi
comercializado no país.
Já a Valneva disse estar "comprometida em manter os
mais altos padrões de segurança" e afirmou ter se envolvido
"proativamente com as autoridades de saúde em todos os territórios onde a
Ixchiq está licenciada para fornecer informações oportunas sobre todos os
eventos adversos graves conhecidos".
Pontuou que, "conforme destacado pela FDA/CDC, os
eventos adversos podem não estar relacionados à vacinação," mas reconheceu
que a "avaliação completa desses casos é fundamental para garantir o uso
seguro" da vacina. "A empresa continua a observar um risco-benefício
positivo na grande maioria das pessoas com exposição potencial à doença",
continuou.
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A chikungunya é uma infecção viral transmitida pelo mosquito Aedes aegypti, o
mesmo responsável pela disseminação da dengue e da zika. Segundo o Ministério
da Saúde, o vírus foi introduzido no continente americano em 2013 e confirmado
no Brasil em 2014. Hoje, ele é bem distribuído pelo país e se manifesta,
principalmente, causando edema e dor articular incapacitante.
Casos graves da infecção podem demandar internação
hospitalar e evoluir para óbito por causarem doença neuroinvasiva, como
encefalite, mielite, meningoencefalite, síndrome de Guillain-Barré, síndrome
cerebelar, paresias, paralisias e neuropatias.
Fonte: O Globo