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25/03/2025 - 3 minutos de leitura
Nos últimos dias, uma nova resolução do Conselho Federal de
Farmácia (CFF) gerou um grande debate no setor da saúde brasileiro.
A norma, publicada no Diário Oficial em 17 de março de 2025,
autoriza farmacêuticos a prescrever medicamentos, incluindo aqueles que exigem
receita médica, a partir do mês que vem. A decisão gerou uma onda de críticas
de associações médicas e especialistas da área, que questionam a legalidade e
os riscos dessa medida.
O que diz a nova resolução do CFF?
A resolução 5 de 2025 do CFF autoriza farmacêuticos, com o
devido Registro de Qualificação de Especialista (RQE) em Farmácia Clínica, a
prescrever medicamentos, incluindo os que precisam de receita.
Além disso, esses profissionais poderão renovar prescrições
previamente emitidas por outros profissionais de saúde, fazer exames físicos,
solicitar e interpretar exames para avaliar a eficácia do tratamento, entre
outras atividades.
A ideia por trás da medida, segundo o CFF, é regulamentar a
função do farmacêutico de traçar o perfil farmacoterapêutico do paciente, ou
seja, avaliar a interação entre os medicamentos que ele já toma, alertando
sobre possíveis incompatibilidades e efeitos adversos.
Porém, a resolução permite que o farmacêutico vá além,
assumindo um papel semelhante ao de um médico, sem, no entanto, a formação
necessária para diagnóstico médico.
A reação das associações médicas
A decisão do CFF gerou indignação por parte do Conselho
Federal de Medicina (CFM), que considera a resolução “absolutamente ilegal”. O
CFM argumenta que a prescrição de medicamentos é uma competência exclusiva dos
médicos, conforme a Lei do Ato Médico (Lei nº 12.842/2013).
A prescrição envolve não apenas a escolha do medicamento,
mas também a investigação, o diagnóstico e a definição do tratamento,
habilidades que, segundo os médicos, não são da alçada do farmacêutico.
Em nota, a Associação Paulista de Medicina (APM) também
expressou preocupação, afirmando que o farmacêutico não possui a formação
necessária para realizar diagnósticos e prescrever medicamentos.
A APM enfatizou que a prescrição médica exige um extenso
processo de formação, que inclui seis anos de graduação, além de três a seis
anos de residência médica. Para a associação, permitir que farmacêuticos
prescrevam medicamentos coloca em risco a segurança dos pacientes, já que eles
não têm a capacidade de realizar um diagnóstico adequado e avaliar a eficácia
de um tratamento com base em exames clínicos.
O argumento do CFF
Por outro lado, o CFF defende que a prescrição terapêutica
não é exclusiva dos médicos. A resolução do CFF foi baseada em uma
interpretação de que os farmacêuticos já têm a competência legal para atuar na
área da farmacoterapia, conforme estabelecido pela Lei nº 13.021 de 2014.
O CFF argumenta que a nova resolução apenas regulamenta e
amplia essa competência, permitindo que o farmacêutico possa prescrever e
monitorar tratamentos dentro de sua área de especialização.
Por: Leticia Florenço/Tribuna de Minas
O Conselho ainda refutou as críticas afirmando que
farmacêuticos com especialização em Farmácia Clínica têm o treinamento
necessário para realizar prescrição de medicamentos, e que a medida é
fundamentada na legislação e nas diretrizes curriculares do curso de farmácia.
Além disso, o CFF lembrou que já existe uma autorização para
farmacêuticos prescreverem profilaxias no caso do HIV (PrEP e PEP), uma prática
regulamentada por conselhos de classe e que, segundo o Ministério da Saúde,
contribui para a eliminação do HIV como problema de saúde pública.
O que está em jogo
A principal preocupação das entidades médicas é com a
segurança do paciente. A prescrição de medicamentos envolve uma série de
decisões clínicas que, se mal conduzidas, podem resultar em danos
significativos à saúde.
Médicos, com sua formação e experiência, são capacitados
para diagnosticar doenças, solicitar exames e prescrever tratamentos adequados.
Para muitos, o farmacêutico, apesar de ser um especialista em medicamentos, não
tem as habilidades necessárias para substituir um médico nesse papel.
Contudo, alguns especialistas defendem que a medida do CFF
responde a uma necessidade crescente de melhorar o atendimento e o acesso à
saúde, especialmente em um país com tantas disparidades no sistema de saúde.
A disputa judicial e as lacunas legais
A nova resolução vem pouco tempo após a decisão da Justiça
Federal, que em 2024 declarou ilegal uma norma anterior do CFF sobre o mesmo
tema. Na ocasião, a Justiça considerou que a permissão para farmacêuticos
receitarem medicamentos era incompatível com a legislação vigente, que atribui
aos médicos a responsabilidade pela prescrição.
Especialistas em direito, como o advogado Henderson Furst,
criticam a medida, afirmando que ela cria lacunas legais e coloca em risco a
saúde dos pacientes. Furst explica que o farmacêutico pode avaliar interações
medicamentosas, mas isso não lhe dá o direito de prescrever tratamentos
completos, uma tarefa que exige um diagnóstico médico.
A possibilidade de uma nova batalha judicial sobre a
legalidade da resolução é forte, especialmente após a decisão anterior da
Justiça.