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FOTO: ILUSTRAÇÃO/REPRODUÇÃO |
O pedreiro Francisco de Oliveira, 45 anos,
tinha o hábito de tomar café três vezes ao dia: uma xícara ao acordar, outra
depois do almoço e mais uma no final da tarde. Como se fosse lei. Há menos de
15 dias, no entanto, ele modificou a rotina. O café depois das 12h não existe
mais. O motivo? O preço do produto, que foi o item que mais encareceu em
Salvador e Região Metropolitana em 2024, com 42,68% de variação, de acordo com
o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Em janeiro, a prévia da inflação do café moído foi de
6,07%. A péssima notícia é que não há previsão de redução no valor do produto.
Em Salvador, o pacote do Maratá 250g é encontrado até R$ 26. Ou seja, o quilo
sai por R$ 104 no Mercadinho Manancial, em Periperi. O levantamento foi feito
no aplicativo Preço da Hora nesta sexta-feira (7). A plataforma oferece dados
das notas fiscais eletrônicas do estado da Bahia para apresentar os melhores
valores praticados ao consumidor.
O encarecimento do café é resultado da seca que atingiu o
Brasil e outros países produtores, como Vietnã, Indonésia e Colômbia e
Nicarágua. Quem explica isso é João Lopes Araújo, presidente da Associação dos
Produtores de Café da Bahia (Assocafé) e diretor da Associação Comercial da
Bahia. Segundo ele, a "coincidência dramática" aconteceu pela
primeira vez em seus 53 anos como produtor do grão.
"Nós esperamos que a safra desse ano não seja tão ruim
como a do ano passado, mas aí não dá para prever nada agora. E o que a gente
sabe é que, a partir de junho, quando começa a se colheita, é que a gente
espera que melhore a situação do abastecimento, porque não tem café nos
estoques em lugar nenhum", disse João Lopes Araújo.
A primeira estimativa da safra brasileira de café para
2025, no entanto, aponta uma redução de 4,4% em relação à safra anterior,
conforme dados divulgados pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) no
final de janeiro. Ao todo, devem ser produzidas 51,8 milhões de sacas. O número
parece ser muito, mas não atende a demanda, segundo João Lopes Araújo.
"É pouco porque se o Brasil exportou, no ano passado,
50 milhões, e esse ano for exportar os mesmos 50 milhões, não sobra para a
gente tomar. (...) O consumidor está aflito, eu recebo todo dia ligação
perguntando por que ele está subindo, se ainda vai subir mais. Infelizmente,
vai", esclareceu o produtor.
A aflição realmente toma conta dos 'viciados em café'.
Francisco de Oliveira, aliás, contou que pode reduzir ainda mais o consumo caso
os preços continuem elevados. "Não tem condições de desembolsar mais de R$
100 em um quilo de café, que eu consumo com a minha família em 15 dias. O jeito
vai ser reduzir a quantidade que a gente toma mesmo”, disse o pedreiro.
O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos
Socioeconômicos (Dieese) que o preço do café em pó subiu em todas as 17
capitais (que fazem parte do levantamento) em janeiro de 2025. "Os
aumentos refletiram a oferta mundial restrita e a especulação do grão nas
bolsas", pontuou o departamento. Entre dezembro de 2024 e o primeiro mês
deste ano, o café foi o segundo item que mais encareceu na cesta básica, 15,05%
de variação, atrás apenas do tomate (50,47%).
Com a crise climática do Vietnã, o Brasil atendeu a demanda
internacional que deveria ser deste outro país. “Além da necessidade de uma
maior exportação para suprir a oferta internacional, com o real desvalorizado
em relação ao dólar, significa que o nosso produto fica mais barato, em termos
internacionais. Então, também houve um aumento das exportações por causa de um
real desvalorizado, e um preço mais atrativo”, apontou Ana Georgina Dias,
supervisora do Dieese.
Já no levantamento da Superintendência de Estudos
Econômicos e Sociais da Bahia (SEI), o café foi o quarto produto com a maior
alta de variação: 11,75%, atrás da cenoura (77,08%), cebola (39,38%) e tomate
(36,60%). “Os fatores climáticos, a elevação de custos e a valorização do dólar
tiveram impacto nas lavouras de diferentes culturas, dificultando a oferta de
alguns produtos e forçando o aumento do preço da Cesta Básica em janeiro de
2025", disse Denilson Lima, economista da SEI.
Mercado e consumo
A Conab projeta um cenário de maior restrição na oferta global de café, com
estoque historicamente baixos e uma demanda crescente no mercado internacional.
De acordo com o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), a
produção mundial para 2024/25 está estimada em 174,9 milhões de sacas, um
avanço de 4,1% em relação à safra anterior, enquanto o consumo global deve
alcançar 168,1 milhões de sacas, gerando um estoque final de 20,9 milhões de
sacas, o menor das últimas 25 temporadas.
No ano passado, o Brasil enviou 50,5 milhões de sacas de 60
quilos ao mercado internacional, um recorde histórico, que representa um
crescimento de 28,8% em relação ao ano anterior, de acordo com dados do
Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC). Ainda
segundo a Conab, o desempenho brasileiro gerou uma uma receita de US$ 12,3
bilhões, marcando um aumento de 52,6% na comparação com 2023.
De acordo com a Associação Brasileira da Indústria do Café
(Abic), foram consumidas 21,9 milhões de sacas de café no Brasil em 2024. O
Brasil segue na posição de segundo maior consumidor de café do mundo. A
diferença para o primeiro lugar, ocupado pelos Estados Unidos, é de 4,1 milhões
de sacas. Se compararmos o consumo per capita do Brasil com EUA (4,9 kg.hab.ano
– café cru), o valor brasileiro é superior.
Fonte: Correio 24horas