O Conselho Federal de Medicina (CFM) aprovou, por
unanimidade, uma nova resolução que proíbe o uso de bloqueadores hormonais para
mudança de gênero em crianças e adolescentes. A medida também aumenta de 18
para 21 anos a idade mínima para a realização de cirurgias de transição que
podem afetar a capacidade reprodutiva.
Essa decisão não se aplica a casos de puberdade precoce ou
outras condições endócrinas, sendo restrita exclusivamente à transição de
gênero. A informação foi divulgada pela Folha de S.Paulo nesta quinta-feira
(10) e confirmada pela Gazeta do Povo. Para ter validade, a resolução ainda
precisa ser publicada no Diário Oficial da União.
No texto, o CFM elevou de 16 para 18 anos a idade mínima
para o início da "terapia hormonal cruzada" — tratamento que prevê a
administração de hormônios de acordo com a identidade de gênero da pessoa. A
norma anterior, atualizada em 2020, já vedava o bloqueio hormonal antes dos 16
anos, devido aos seus efeitos colaterais.
A realização de procedimentos cirúrgicos com efeito
esterilizador só será permitida a partir dos 21 anos. Já as cirurgias de
redesignação de gênero sem impacto sobre a fertilidade permanecem autorizadas a
partir dos 18 anos.
Como justificativa, o CFM citou uma mudança legal aprovada
pelo Congresso em 2022, que reduziu de 25 para 21 anos a idade mínima para a
realização de laqueadura e vasectomia no país.
A nova resolução também estabelece que os serviços médicos
que realizarem procedimentos cirúrgicos de transição de gênero deverão,
obrigatoriamente, cadastrar os pacientes e repassar as informações aos
Conselhos Regionais de Medicina competentes.
Além disso, o texto orienta que pessoas trans que mantêm
órgãos do sexo biológico original devem seguir com os cuidados preventivos e
terapêuticos junto a especialistas da área correspondente. Isso significa que
homens trans com órgãos reprodutivos femininos devem continuar se consultando
com ginecologistas, enquanto mulheres trans com órgãos masculinos devem buscar
acompanhamento com urologistas.
Segundo conselheiros do CFM ouvidos pela Folha, a medida
segue uma tendência internacional, com países como Reino Unido e Suécia revendo
protocolos de transição de gênero para menores de idade.
O que diz o Ministério da Saúde
Pela Portaria 2.803/2013 do Ministério da Saúde, que redefine e amplia o
Processo Transexualizador no Sistema Único de Saúde (SUS), a hormonioterapia
somente pode ser iniciada a partir dos 18 anos de idade do paciente no processo
transexualizado. Para acessar esse serviço, é necessário procurar uma Unidade
Básica de Saúde (UBS) para obter o encaminhamento adequado.
Em dezembro do ano passado, o governo anunciou criação do
Programa de Atenção à Saúde da População Trans (Paes Pop Trans), mas a portaria
que regulamenta a iniciativa ainda não foi publicada. Segundo a pasta, o
objetivo é saltar de 20 para 194 procedimentos habilitados para trans no SUS
até 2028. A previsão de investimento é de R$ 152 milhões até 2028, sendo R$ 68
milhões repassados já em 2025.
A iniciativa do governo Lula prevê que adolescentes a
partir dos 16 anos tenham acesso ao uso de hormônios, pelo SUS, para mudanças
de gênero. As cirurgias de redesignação, antes previstas para adultos a partir
de 21 anos, poderão ser feitas a partir dos 18 anos no serviço público. Essas
informações divulgadas pela Folha ainda não foram confirmadas oficialmente, e o
governo ainda não divulgou as diretrizes do programa.
Caso o governo federal, oficialize as mudanças no SUS para
troca de gênero, a resolução do CFM servirá para contrapor e garantir o
posicionamento embasado pelos médicos sobre o assunto.
A Gazeta do Povo entrou em contato com o Ministério da
Saúde para saber se tem alguma novidade sobre o programa e o posicionamento da
pasta sobre a decisão do CFM, mas ainda não teve um retorno. O espaço segue
aberto para atualização.
Riscos para a saúde
Em junho de 2022, a Gazeta do Povo mostrou que o tratamento hormonal não é
indicado pelo CFM para crianças e adolescentes que querem mudar de sexo pelos
seus importantes efeitos colaterais, com risco de arrependimento do processo
pouco tempo depois.
Estudos feitos com pessoas nessas faixas etárias apontam
que a disforia de gênero permanece na idade adulta somente entre 3% e 23% dos
casos e as situações de jovens que se arrependeram não são incomuns. Um dos
mais conhecidos é o de Keira Bell que, após ser diagnosticada aos 14 anos com
disforia de gênero, se arrependeu dos tratamentos de reversão de gênero aos 16
anos e conseguiu decisão favorável na Justiça do Reino Unido para que os
responsáveis pelo seu processo precoce de transição de gênero pagassem seu
tratamento de saúde.
No Guia Prático de Atualização sobre disforia de gênero,
publicado em 2017, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) apresentou os
riscos associados ao tratamento hormonal - que podem variar entre aumento de
peso, doenças cardiovasculares, diabetes, hipertensão e até câncer de mama. A
sociedade reforçou que o pediatra não pode prescrever tais medicamentos, apenas
endocrinologistas.
Ainda sobre o controle da puberdade, o guia determina que o
uso de medicamentos só pode ser iniciado no adolescente, após o "suporte
psicológico permanente, entendimento das mudanças físicas e dos riscos da
terapia e assinatura do termo de consentimento e assentimento informado pelos
pais e/ou pelo adolescente."
Fonte: Gazeta do Povo